segunda-feira, 28 de fevereiro de 2005

"Million Dollar Baby" grande vencedor dos Oscars

É uma das ironias desta edição dos Óscares: Martin Scorsese e «O Aviador» perderam para um filme em que o boxe é apenas uma metáfora para muito mais, tal como foi o caso de «O Touro Enraivecido» 24 anos antes.

«O Aviador» começou por ser o filme mais citado da noite, ganhando em diversas categorias prémias. Todos os premiados demonstraram nos seus discursos um enorme carinho por Martin Scorsese, que chegou a comover-se com o discurso da sua editora de sempre, Thelma Schoonmaker.

Por essa altura, a cerimónia estava a atribuir os prémios de acordo com a maioria das projecções, excepção (relativa) talvez no prémio para Melhor Caracterização, que foi para «Lemony Snicket» e não «A Paixão de Cristo». Apesar do suspense em algumas categorias de interpretação, o Óscar acabou por ser atribuído aos que se sabia terem ganho maior protagonismo nas semanas que antecederam os Óscares: Morgan Freeman, Cate Blanchett e Hilary Swank. Apenas chegado à categoria da realização, se perceberia o rumo final da cerimónia: a vitória foi para Clint Eastwood (o mais velho realizador a ser premiado) e este ainda não seria este o ano de Martin Scorsese, não obstante «O Aviador» ter sido o filme que recebeu mais Óscares na noite (cinco, contra quatro de «Million Dollar baby»). Scorsese, com 5 nomeações e 0 Óscares, junta-se a cineastas como Alfred Hitchcock e Robert Altman.

O palmarés final confirmou as projecções do ascendente de «Million Dollar Baby» nas últimas semanas e, quanto mais não seja, ao atribuir os seus principais Óscares a um filme intimista, desmente uma vez mais os comentadores da desgraça do cinema norte-americano, alegadamente dominado pelos efeitos visuais.

De resto, todos os filmes nomeados para o Óscar de Melhor Filme receberam pelo menos um Óscar, numa cerimónia que começou por passar clips de filmes da história do Cinema e cuja narração referia serem os Óscares uma altura de olhar o passado e o futuro, mas que mais uma vez a celebração do cinema saiu prejudicada. O que a cerimónia ganhou em rapidez (durou cerca de três horas e 10 minutos), ganhou também em aborrecimento e isto não necessariamente por causa dos prémios previsíveis. Perante a obsessão de reduzir o tempo da cerimónia, que chegou aos episódios caricatos de premiados fazerem o seu discurso da plateia ou Scarlett Johansson fazer a sua apresentação de um balcão recuado, as imagens de filmes ficaram praticamente reduzidas às que acompanhavam as nomeações nas categorias de interpretação, e dos filmes do passado apenas imagens antes do intervalo. Os clips dos cinco filmes nomeados ao Óscar principal foram eliminados e nem sequer o desaparecimento de Marlon Brando recebeu a atenção que o ano passado recebeu Katharine Hepburn.

A escolha dos apresentadores foi tradicional, principalmente de actores e actrizes nomeados nas categorias de interpretação, os textos para eles escritos rápidos e pouco inspirados. As excepções foram a introdução de Al Pacino a Sidney Lumet, a apresentação de Robin Williams (cuja fita adesiva na boca com que entrou em palco denunciava os rumores de que os produtores censuraram algumas das piadas que ele tinha previstas), Pierce Brosnan ao lado de Edna `E` Mode, de «The Incredibles» e o diálogo entre Adam Sandler e Chris Rock, com este a fazer as vezes de Catherine Zeta-Jones, lendo as frases que era suposto dizer a actriz também escalonada para apresentar a categoria.

Por outro lado, a cerimónia esteve longe de ter grande brilho. Os planos da audiência foram escassos, a realização teve falhas pouco habitais (nomeadamente antes do anúncio do Óscar para Melhor Actor Secundário) e a maior parte dos discursos dos premiados, que cumpriram quase sempre as regras estipuladas do tempo disponível, foram para esquecer. Um destaque especial para Jorge Drexler: premiado pela canção "Al Otro Lado Del Río", de «Diários de Che Guevara», que canta no filme, não foi convidado para fazer o mesmo na cerimónia, onde foi substituído por Antonio Banderas e Carlos Santana; quando recebeu o Óscar, cantou algumas partes, contribuindo para um momento belíssimo na cerimónia.

A sofisticação parece ter ficado apenas pelos vestidos da maior parte das actrizes, inspirados nos anos 30 e 40, que, ainda assim, parecem ter sido desenhados para dificultar a locomoção das mesmas. Já a cantora Beyonce Knowles, pela altura em que cantou a canção de «O Fantasma da Ópera», primou pelo exagero brutal: parecia desaparecer por detrás do maior colar de jóias e brincos existentes em Hollywood.

Quanto ao anfitrião, Chris Rock, embora a própria filosofia do programa o tenha prejudicado, pode-se dizer que acertou algumas piadas, mas falhou muitas mais. Também aí houve "raça" a mais e "cinema" a menos.

Fonte: Cinema 2000

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