quinta-feira, 12 de agosto de 2004

"Nascimento de uma nação" continua a provocar polémica

D. W. Griffith é considerado o pai do cinema americano e «O Nascimento de uma Nação» o primeiro épico do cinema. Apesar de ter sido realizado há 89 anos, algumas organizações continuam a protestar contra a sua exibição.

A prevista exibição de «The Birth of a Nation»» pelo Silent Movie Theater em Hollywood para esta segunda-feira, 9 de Agosto, foi cancelada depois de protestos levados a cabo por espectadores, pela "National Association for the Advancement of Colored People" (NAACP), organização que procurar garantir a igualdade social, política, educacional e económica dos grupos minoritários nos Estados Unidos, e por um grupo intitulado "National Alliance for Positive Action", que ameaçavam fazer piquetes ao pé da sala de cinema.

Ainda que Charlie Lustamn tivesse alegado que a exibição se destinava a destacar a sua importância cinematográfica e que ele tencionava apresentar uma declaração de que não apoiava o conteúdo racista do filme, os dois grupos alegavam que a obra continuaria a envenenar as relações entre as raças. Lustmamn tencionava acompanhar o filme com uma introdução de um estudioso e seguido de um debate com os espectadores.

O proprietário informou ainda que recebeu ameaças pelo telefone e estava preocupado com a segurança dos espectadores e de Bob Mitchell, o líder com 92 anos do famoso Mitchell Boys Choir (presença em vários filmes dos anos 40), que iria tocar a música que iria acompanhar a exibição.

Baseado num questionável romance, «The Klansman», de Thomas Dixon, «O Nascimento de uma Nação» conta a história de famílias do Norte e do Sul divididas pela Guerra Civil de 1861-1865. O filme descreve essa guerra, o assassinato de Abraham Lincoln e principalmente a anarquia provocada no Sul após o fim do conflito, com violadores negros a aterrorizar a população branca até esta ser salva pela chegada do Ku Klux Klan!

Houve várias organizações que usaram a designação "Ku Klux Klan", mas a primeira era um grupo que se opunha às políticas de Reconstrução após o fim da Guerra Civil e que defendia a "supremacia branca". Para fazer face ao caos, formaram grupos de vigilantes armados, que se cobriam com máscaras brancas e recorriam ao terror para atingir os seus fins, não raras vezes com chicoteadas dos velhos tempos e linchamentos.

Com a participação de grandes estrelas do cinema mudo de então, como Lillian Gish, Mae Marsh, Henry B. Walthall e Miriam Cooper, o filme é considerado um marco da história do Cinema, utilizando pela primeira vez a linguagem cinematográfica moderna que hoje conhecemos. Mas também é considerado bastante racista, com a sua apresentação estereotipada de negros como vilões, Ku Klux Klan como heróis e actores brancos pintados de negro. As suas repercussões foram tão grandes que «E Tudo o Vento Levou», mais de 20 anos depois, chegou a estar em causa, pelo retrato que poderia dar dos membros negros. De acordo com a NPAA, «Birth of a Nation» "envenenou as relações raciais na América durante quase um século". A NPAA considerou o cancelamento uma vitória sua e de outras organizações sociais.

Griffith, que ficou chocado por não ter detectado que o seu filme tivesse conteúdo provocador e reaccionário, viria a redigir um manifesto pela liberdade de expressão e dedicaria os dois anos seguintes às filmagens de um filme que retratava a intolerância social ou religiosa ao longo de vários episódios da História: «Intolerância». E, pela 2.ª vez, o cinema nunca mais voltaria a ser o mesmo.

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